Caprichoso por demais

Dentro deste tema, que é contrário ao “relaxado”, lhes conto um causo verídico, ocorrido comigo e meu irmão já falecido

Acredito que esta expressão já esteja fora de moda. Ninguém mais procura casamento sob a condição de que a pretendida seja caprichosa. Os critérios da atualidade são outros bem diversos, até mesmo porque a maioria das mulheres nem lida mais com afazeres domésticos, pois trabalham fora, são empresárias, e muitos maridos é que viraram gestores do lar.

Pouca gente ainda exige do funcionário (empregada doméstica, pedreiro, peão caseiro, tratorista, alambrador, etc.) a condição fundamental de que tenha capricho especial para aquela lida peculiar. E sabem por quê? Porque hoje em dia está muito difícil encontrar quem esteja disposto a trabalhar em determinadas condições e tipos de serviço. O que mais se escuta é que não existe mais ninguém que queira trabalhar pra fora, por exemplo.

Mas houve um tempo, quando os trabalhos manuais predominavam, em que essa condição fazia muita diferença: ferreiro, carpinteiro, marceneiro, mecânico automotivo, funileiro, costureira, etc. precisavam executar os seus serviços com esmero e muito capricho, para conquistar a clientela/freguesia.

Dentro deste tema, que é contrário ao “relaxado”, que antigamente, para alguns, era sinônimo de sujo, descuidado, imundo ou coisa que o valha, lhes conto um causo verídico, ocorrido comigo e meu irmão já falecido.

Nós éramos dois, criados lá por fora, até vir estudar na cidade, conforme acontecia nas décadas de 1960/70 com a gente do interior de Caçapava. Depois, segui a carreira militar, conhecendo e servindo pelo Brasil afora, e meu irmão se fixou em nossa propriedade no interior, lidando com a pecuária e a agricultura.

Os carros que eu possuía eram novos ou seminovos, e os dele, sempre mais antigos e mais rústicos, para aguentar a precariedade das estradas do nosso interior e carregar bugigangas e gêneros alimentícios. E ele nunca foi de cuidar muito das coisas, nunca foi muito caprichoso. Pelo contrário, carregava a fama de ser um tanto quanto “relaxadão” em tudo que fazia, não dispensando muito cuidado com os detalhes e com a limpeza.

Certa vez, o meu irmão adquiriu um automóvel Opala em bom estado. Quando cheguei à casa dele, a primeira coisa que fez foi me apresentar o carro recém-adquirido:

– Veja isto, “ermão”! – que era como ele me chamava – Agora sim, comprei um carro bom e pretendo cuidar dele com capricho. Já instalei um toca-fitas novo, tá bem cuidado por dentro, troquei o pneu de estepe e até mandei lavar. Este será para passeio da família, sempre em boas condições e limpinho.

Fiquei surpreso com a sua mudança de atitude e pelos procedimentos não usuais que ele estava adotando com aquele novo carro. Abrindo a tampa do porta-malas, forrado com carpete da cor beje, senti de imediato o forte  cheiro de esterco, e logo descobri que ali estava uma enorme quantidade de excrementos suínos, esparramados pelo assoalho.

– Mas que barbaridade! – me disse ele, envergonhado e sarcástico – Carreguei um porco cachaço que comprei ontem e não vi que e o bicho havia me cagado no carro novo.

Não demorou muito tempo para o carro recém-comprado estar do mesmo jeito dos outros que tivera, porque capricho não era um item que ele apreciasse em primeiro lugar.