Esta, pra mim, é daquelas estórias que sinto que conheço de tanto ouvir falar. Além do sucesso do livro, há também o da adaptação para o cinema, que lembro de passar seguido na TV até poucos anos atrás. Nunca vi o filme, mas esse excesso de “ouvir falar” me fazia não ter vontade de ler o livro (o que é estranho, já que, com outros, acontece o contrário).

Porém, isso durou só até eu olhar com atenção para a capa da edição da Rocco, publicada em 2020, e ver ali “Tradução de Clarice Lispector”. Eis aí uma faceta da autora com a qual, até então, eu não havia tido contato, a Clarice tradutora, e não pude resistir. Soube, naquele momento, que precisava ler Entrevista com o vampiro.

Um vampiro, Louis, está com um jovem que se propõe a entrevistá-lo para que conte sua história. Eles se conheceram em um bar, e é possível afirmar que, na penumbra comum a esses ambientes, o rapaz não tenha podido vê-lo bem, tamanho o susto que toma quando o vampiro acende a luz.

Louis tinha 25 anos quando foi transformado, em 1791. Tudo começou com a morte de seu irmão mais novo, Paul. Imigrantes franceses, na época, viviam em uma fazenda na Louisiana, com a mãe e a irmã. Paul era muito religioso e tinha vocação para padre. Aos 15 anos, começou a ter visões, o que o afastou de todos e de suas atividades habituais.

Nessas visões, santos lhe diziam para vender tudo que pertencia à família e retornar à França para servir a Deus, combatendo o ateísmo e a Revolução. Quando Louis não aceitou seguir essas ordens, Paul ficou furioso, saiu desnorteado, e acabou caindo em uma escada e quebrando o pescoço. Todos culparam Louis, inclusive ele mesmo, o que o deixou transtornado e afetou a vida da família.

Mas como ele irá disso a se tornar um vampiro? Como será sua vida (se é que se pode chamar assim) a partir de então? Uma das coisas que diz ao entrevistador é que, pra ele, é muito importante contar sua história. Mas por quê?

Enquanto faz o relato, Louis irá refletir e/ou fazer os leitores refletirem sobre a relação das pessoas com a religião e sobre o desejo de imortalidade. Será tão bom assim viver para sempre?

Uma crítica a ser feita a esta edição de Entrevista com o vampiro é sobre a dificuldade para se identificar quem fala em alguns trechos. Mesmo quando é Louis quem segue falando, há novo travessão, fazendo parecer que é um interlocutor quem se manifesta. Além disso, narrativas do presente e do passado se misturam. Muitas vezes, o leitor tem de parar e reler essas partes para, então, conseguir entender.

 

Referência:

RICE, Anne. Entrevista com o vampiro. Tradução de Clarice Lispector. 1ed. Rio de Janeiro: Rocco, 2020. 320p.