Confesso que não esperava por um diagnóstico desses, e logo depois que a surpresa saiu voando, me parei de pensador, maquinando a respeito daquele dito
Conforme havia lhes adiantado na croniqueta da semana passada, andei por Santa Maria, consultando com um médico urologista. Abaixo de chuva, que, aliás, já está enchendo o saco de todo mundo e trazendo prejuízos de toda laia aqui para nós do Sul Brasileiro. Saindo às cinco e meia da manhã, me fui, faceirito, cumprir uma obrigação para comigo mesmo.
Fui atendido antes da hora agendada, o que já é uma boa novidade. Encontrei um jovem médico, catarinense, simpático, atencioso, afável e bom de papo. Após a primeira entrevista de praxe, lascou uma constatação espontânea a meu respeito: “Que bom que o senhor envelheceu muito bem!”
Confesso que não esperava por um diagnóstico desses, e logo depois que a surpresa saiu voando, me parei de pensador, maquinando a respeito daquele dito. Será que eu estava bem, apesar de já estar velho, ou eu estava velho, mas ainda andava bem? Estaria bem, dentro da relatividade da minha idade avançada? Podem ser as duas coisas: velho, mas bem, e bem, embora envelhecido.
Mas que situação essa em que a vida me embretou: estão me achando velho, gasto, vivido, experiente, mas relativamente ou aparentemente ainda jovial e com boa saúde. Devem de ser os bailezitos de final de semana, uns tragos episódicos de cachaça com butiá, bem curtida, e um encarar das cosas da vida de um jeito leve e até um tanto pachorrento. De cuca fresca, no más…
Em dezembro do ano passado, quando participei dos 50 anos de formatura da minha turma da Aman, fizemos uma foto histórica, que tenho emoldurada na minha sala das escritas, com a participação de 198 integrantes presentes. Para mim, estavam todos envelhecidos e apenas eu ainda moço. Agora, o tal médico vem dizer que eu também me tornei um velhinho daqueles da foto.
Conforme já repetiam os mais longevos do meu tempo de mocito, o tempo passa, a barba cresce, o forno esfria e o pão não cresce. Somente os espelhos e os jovens tenentes, médicos urologistas de Santa Maria, são capazes de nos colocar no lugar devido, ao longo das miradas pretenciosas em que tentamos enganar a nós mesmos, nesse girar sem trégua dos ponteiros dos relógios de bolso, que hoje nem existem mais, guardados em gavetas pouco abertas, de cristaleiras coloniais. Também envelheceram. Pensei, logo no primeiro momento, na crônica que escreveria e na filosofada a que me atreveria quanto ao envelhecer de um jeito bom.
Acredito que temos de valorizar os momentos, não parar nunca de pensar, e também não virar ilha no meio da comunidade a qual pertencemos. A política traz alguns percalços, porquanto somos amados e acalentados por alguns e desprezados e antipatizados por outros. É oito ou oitenta. Mas agora também já era e não é mais possível desviver tempos passados, bem ou mal vividos.
Pensei também numa esperança surgida desse papo: se já estamos velhos e ainda parecemos estar em boas condições de saúde, então é bem provável que iremos conseguir incomodar uns anos a mais por esse mundão de nosso Deus. Tomara!