Democracia! Ouvi esta palavra, pela primeira vez, nas recomendações do diretor da Escola João Neves, diante dos alunos perfilados à porta de entrada: na democracia, somos todos iguais perante a Lei, com deveres a cumprir e direitos a receber. E enfatizava que o direito de cada um ia até o direito do outro.

Com outras palavras, nossa professora e orientadora religiosa, Noemy Athaíde, falava-nos no “sentido do outro”, isto é, na capacidade de colocarmo-nos no lugar do outro, seguindo os mandamentos da igreja que nos exorta a amar ao próximo como a nós mesmos e desejar-lhe o bem que desejamos para nós. Hoje, se fala em “empatia”, que é uma qualidade essencial para a vida em sociedade.

E não ficavam só nas palavras as recomendações de nosso querido diretor: os regulamentos da Escola precisavam ser seguidos à risca, a começar pelo uso do uniforme, sem enfeites, colares, pulseiras ou maquiagem que viessem a distinguir os alunos por classes sociais, ideais políticos ou quaisquer outros que privilegiassem um determinado grupo e desfavorecessem outros.

E eu sonhava que o Brasil vivia essa democracia. Que suas riquezas eram distribuídas com equidade em todos os setores que formam a sociedade. Nas apresentações de nosso Coro Orfeônico, as canções falavam das belezas de nossas matas, dos rios caudalosos, de águas cristalinas, da fertilidade de nosso solo, das minas de tesouros minerais, diamantes, esmeraldas. Inesgotáveis. “E tudo isso é teu, bandeirante do Sertão.”

E eu lembrava as férias no sítio do Dindo: bebendo o leite ordenhado na hora pelo Adilino – o peão fiel –, sem preocupação com aftosa; comendo as frutas do pomar, sem agrotóxicos; e banhando-nos nas águas da lagoa ou do Rio Jacuí, límpidas, deixando ver o fundo forrado de pedrinhas e os peixinhos. Na sala da casa, as fotos de Lincoln e Visconde de Mauá demonstravam os ideais desse querido tio. Lincoln, representando a Justiça, e Mauá, o empreendedorismo, a primeira via férrea que veio impulsionar os transportes, o comércio, e nos elevou a novos patamares de progresso e enriquecimento.

Vias férreas e vias fluviais se complementavam no transporte de nossos produtos aos portos, no incessante comércio internacional, que aumentava nossas divisas. Hoje, vejo com tristeza o desmantelamento dos trilhos, locomotivas em museus ou servindo de quiosque nas praias.

Hoje, os caminhões que vieram substituí-los em nome do progresso, da maior rapidez nas entregas e do maior lucro, mesmo à custa de acidentes fatais, são para nós o símbolo de uma ideologia desumana que, em nome de uma falsa democracia, destrói Palácios da Justiça, do Congresso e da Presidência do Brasil. Num flagrante desrespeito à vontade do povo que os elegeu nas urnas.

Mas o Brasil que eu sonho é aquele que o novo governo está anunciando: um país que, em sua Constituição, prioriza a vida, os direitos dos cidadãos e seus anseios de liberdade, iguais oportunidades na Educação, nos empregos, nos seus sonhos de crescimento.

Que os trabalhadores não precisem viver para trabalhar, mas que trabalhem para viver e dar sustento a suas famílias. Sobre-lhes tempo para o convívio no lar, acompanhamento dos filhos nos estudos e no lazer, da esposa nos planos e tarefas. Sejam protegidos por sindicatos que lhes promovam colônias de férias e centros de lazer.

Enfim, que os fariseus tirem as máscaras de filantropos, à custa do erário público, e os samaritanos destinem seus cuidados e o que têm supérfluo para socorrer os vulneráveis.

E que o povo possa sorrir, cantar e confraternizar em praça pública, celebrando os novos tempos, a paz e a solidariedade que vieram para ficar.