Tenho pensado muito na vida. Aposentada tanto da profissão como dos cuidados com os filhos – agora eles é que me cuidam –, sobram-me momentos comigo mesma, quando faço um balanço dos acontecimentos do mundo e tiro minhas conclusões.

As injustiças sociais sempre me incomodaram, mais agora quando os meios de comunicação nos relatam ao vivo o que vem acontecendo no país e no mundo. Privilégios para uns poucos e dureza da vida para a maioria. As diferenças que nos separam…

Pensando bem, há também certas proximidades calamitosas que acabam em violência, desajustes e doenças dos nervos. Já perdi a conta de quantos feminicídios vêm acontecendo toda semana. Namorados que levaram o fora e não se conformam com o fim do romance. Companheiros ou maridos, separados ou abandonados pela companheira ou a esposa, que não aceitam o rompimento ou se revoltam quando sua ex recompõe a própria vida com alguém mais equilibrado.

Medidas protetivas nem sempre chegam a tempo, e muitas vezes há mais vidas sacrificadas, seja o novo companheiro, parentes e até vizinhos que vêm prestar socorro.

Fico pensando como um sentimento de amor que uniu o casal com boas expectativas pode ter-se deteriorado tanto! A proximidade, em vez de unir, afasta quando não há compreensão, compartilhamento de responsabilidades, aceitação dos defeitos de cada um.

Muito se tem falado que o amor verdadeiro, que resiste aos contratempos, não é o que só valoriza as qualidades do parceiro, mas o que ama os seus defeitos, pois é isso que torna a pessoa singular, diferente de todas.

Conheci um casal que se amou de paixão. Ele era casado com outra, e ela era a secretária dele. Passavam todo o dia juntos no trabalho, nas refeições e reuniões profissionais. Não deu outra. Casamento desfeito, e o par assumiu a nova relação. Se fosse um conto de fadas, diríamos que viveram felizes para sempre.

Quando os conheci, os dois estando aposentados, o ambiente familiar foi encarado de frente, os defeitos descobertos, e as implicâncias do dia a dia aumentaram. Aos poucos, foram resolvendo o problema: de manhã ele saía, encontrava amigos, ia ao clube, ao Café, e ela ficava sozinha com suas manias. À tarde era ela que ia às compras, tomava chá com as amigas, participava de campanhas sociais beneficentes, enfim, era um amor de pessoa.

Até nisso as diferenças de status intervêm. Nos lares humildes, a família comprimida entre as poucas peças – agora na pandemia –, faltando dinheiro, os xingamentos e até as agressões físicas vão acontecer. O marido vai ao boteco empinar uma caninha, a esposa se desespera, adoece ou abandona o lar, arruma outro companheiro, e a guerra está feita. E a violência vai tomando conta das famílias, e os filhos é que pagam o estrago.

Outro casal uniu-se não sei por quê. Ele era o tipo intelectual de fachada, falava das culturas da Antiguidade, era vaidoso porque se achava o mais inteligente dos grupos que freqüentava. Casou com uma mocinha muito bonita, mas sem instrução. Aos poucos ele foi criticando sua ignorância, exigia que, nas reuniões de amigos, ela fechasse a boca para não dizer bobagem. Como naquele programa da Ofélia, aquela que só falava quando tinha certeza. Mas a coitadinha da moça era tímida e foi ficando com baixa estima. Ela foi definhando, achando-se inferior ao marido e seu grupo, e acabou internada num hospital psiquiátrico.

Pois é, chego à conclusão de que os problemas pelas distâncias que separam e a proximidade demasiada, ambas geradoras de conflitos sociais e familiares, precisam ser tratados com toda a seriedade por todos nós, e que se faça o “Mea culpa”.

Cada vez mais me convenço: só o amor constrói.